domingo, março 31, 2013

Poema NO DOMIMGO DE PÁSCOA

No domingo de Páscoa
vi um cego a almoçar num restaurante,
Levava o garfo à boca, e entretanto sorria,
cândidamente,
como só os cegos sabem sorrir.
Comia frango, e ao servir-se do garfo ora trazia
comida nova, ora coisa nenhuma,
ora tendões e peles já antes mastigados,
ora tudo junto,
dependurado de qualquer maneira,
sorrindo sempre, cândidamente.


Eu então levantei-me, e assim mesmo,
de sapatos castanhos,
calças e casaco da mesma cor,
alto, magro e bastante calvo,
aproximei-me do cego
e disse-lhe imperativamente:
__Abre os olhos!


Que ridículo!
Uma coisa que só aos deuses pertence.

António Gedeão

segunda-feira, março 25, 2013

QUADRAS

Depois que Deus fez o mundo
E o seu destino lhe deu,
Não nasceu virtude nova,
Nem vício novo nasceu.

Foi sempre o mesmo conjunto
De malícias e bondades:
As mesmas boas acções
E as mesmas perversidades.
Fernandes Costa

terça-feira, março 19, 2013

NÃO SE CHAMA POESIA

Mentiria se dissesse
Que não tenho companhia.
Mentiria.
Negaria as madrugadas,
Os vultos nos meus ouvidos,
As palavras nos meus olhos,
O esplendor nos meus sentidos.
A rosa que veio alada
De uma inaudível balada,
De um inaudível planeta.
Mentiria se explicasse
O espectro, o búzio, a vertigem.
Vã segurança. O abismo.
O arco de luz, o sismo.
O raio Laser e a seta
Mesmo no meio dos olhos.
A cruz roída que sou:
Os dois troncos sem raiz,
Enterrada em verde relva
Irmã de irmãos sem país.
Unida em cordas de esparto,
Vestida em espinhos de sangue,
Sombria na luz do quarto.
Dentro da terra, volante.
Mentiria se dissesse
Que não tenho companhia.
Mentiria se dissesse
Que se chama Poesia.
Natércia Freire

segunda-feira, março 11, 2013

O POETA

Este, de sua vida e sua cruz
Uma canção eterna solta aos ares,
Luís de ouro vazando intensa luz
Por sobre as ondas altas dos vocábulos.

Carlos Drummond de Andrade 

sexta-feira, março 08, 2013

BEIJOS

Há beijos ideais e duradouros,
Sublimes, fugazes, penetrantes,
Há beijos que p'ra nós valem tesoiros
E nos fazem lembrar cenas tocantes.

Há beijos inocentes e suaves,
Há beijos venenosos, de traição,
Há beijos brandos como penas d'aves
_São os beijos honestos d'um irmão.

Há beijos singulares, misteriosos,
Amargos e de dor indefinida,
Que recordam momentos bem saudosos
_Os beijos que se dão na despedida.

Mas os beijos d'essência, os mais sagrados,
Que nunca esquecem pela vida além
São os beijos benditos, adorados,
Que nos dá com amor nossa mãe !

Lina X. Castro Soares