quinta-feira, janeiro 29, 2015

BARCAROLA

A voz da água não ouço
Sem que me lembre um soluço
Águas do lago, do poço,
Dos rios em alvoroço,
Quando nelas me debruço.

Ando sozinho entre as velas
E os barcos de proas largas
Ora azuis, ora amarelas.
Mar de estranhas aguarelas,
Mar de lágrimas amargas.

Nesta viagem comprida
Não sei que vento embalou
A minha barca perdida.
Nem saiba eu nunca na vida
De onde venho, aonde vou !


Cabral do Nascimento

domingo, janeiro 25, 2015

POEME DE SHAPO

               POEME DE SHAPO
                
traduit par Boileau

Hereux qui, près de toi, pour toi seule soupire,
Qui jouit du plaisir de t'entendre parler,
Qui te voit quelquefois doucement lui sourire.
Les dieux, dans son bonheur, pourraient-ils  l'égaler ?
Je sens de veine en veine une subtil flamme
Courir par tout mon corps sitôt que je te vois ;
Et dans les doux transports où  s'égare mon âme,
Je ne saurais trouver de langue ni de voix.
Un nuage confus se répand sur ma vue,
Je n'entends plus, je tombe en de douces langueurs ;
Et  pâle, sans haleine, interdite, éperdue ,
Un frisson me saisit, je tombe, je me meurs !

terça-feira, janeiro 20, 2015

SONETOS ÍNTIMOS

I
     
Não sei se são saudades o que sinto,.
Não sei se é de saudade que estremeço.
E tenho na alma um travo de absinto
Cuja fatal origem desconheço.
     
Da minha carne o animal instinto
Nem uma vibração lhe reconheço...
Sorrir não posso, mas chorando minto,
Pois afinal é um bom o que padeço.
      
Da tua graça etérea me sustento.
E assim me encanta o gozo e o tormento
Nesta paixão profunda e singular !
     
Bendigo o sofrimento que me ordenas,
Que a vida para mim reside apenas
Na luz do teu olhar.
      
II
     
Fico-me às vezes a pensar perplexo,
Que sou apenas uma sombra alada
Do que tu és; um pálido reflexo
Do sol que canta dentro de ti, mais nada.
     
Num deleitoso, espiritual amplexo,
Enlaça-te a minha alma desvairada,
Se a tua boca, num ritmar complexo,
Oscular a minha boca insaciada.
     
Prisioneira do Amor, as minhas penas
Têm aroma súbtil das acucenas;
_São como pombas mansas num pombal;
     
Benvinda serias tu à minha cela
Anjo da minha guarda, minha estrela,
Sublime encarnação do meu ideal ! 
     
III
     
Dizem que os beijos cansam, que enfastiam,
Que só o primeiro beijo tem sabor...
Nem sempre. Isto depende do fervor
Das delicadas almas que os viam.
     
Aqueles que florescem, que irradiam
Do mais intenso, do mais puro amor,
Quanto mais repetidos com ardor
Mais saborosos são, mais inebriam.
     
Vê tu os nossos beijos, minha Amada
Como na sua essência perfumada
Atingem, dia a dia, a perfeição !
     
É que os beijos de Amor são milagrosos !
Morrem, a rir, nos lábios amorosos,
Para ressuscitar no coração !
     
Carlos de Moraes

sábado, janeiro 17, 2015

CERRAÇÃO

Sim! o chorar é bom! Sai o pranto às levadas.
Brotam do coração lágrimas represadas!...
                              Numa dor violenta,
é o vulcão que irrompe, é a onda que rebenta!
    
Sim! o chorar é bom! Alivia e consola!
No cúmulo da dor, é a suprema esmola
com que Deus suaviza a alma dolorida,
como orvalho que cai sobre a flor ressequida!
    
Sim! o chorar é bom!...  A lágrima furtiva
que às vezes nos provoca uma mágoa mais viva,
_dor que não chega a ser, dor passageira e calma_
não é choro... O chorar é o arranque da alma!...
    
                        Cristovam Ayres

domingo, janeiro 11, 2015

PORQUÊ ?...

Porque te amei __ perguntas __ de improviso ?...
Porque te amei, amor ?... Vão lá sabê-lo !
Talvez por ser tão negro o teu cabelo,
Talvez por ser tão claro o teu sorriso ...
    
Seria porque em teu olhar diviso
a luz que me anuncia o setestrêlo ?
Ou nele adivinhei, sem conhecê-lo,
o caminho que leva ao paraíso ?...
    
Talvez por teu frescor de juventude,
pela graça gentil de uma atitude,
o encanto que se sente e não se vê ...
    
Mistérios do amoroso coração
nunca pode entendê-los a razão ....
Ama-se a gente sem saber porquê.
      
             Cardoso dos Santos

segunda-feira, janeiro 05, 2015

A M O R

Amor _ seiva da vida que a alma enflora ;
Flor da alma em que florece a esperança ;
É fogo ardente, em chama na lembrança ,
Que o peito gela e o coração devora ;
     
É cobarde vencido a toda a hora ;
Herói que tudo vence e tudo alcança ;
Cuidado que não dorme nem descansa ...
Desvairado prazer que ri e chora ;
     
É facho oculto que ilumina a Gente ;
É dor que nos consola e nos tortura ;
É delícia que dói constantemente ...
     
Negro fantasma e aparição querida ;
Desgraça que nos traz toda a ventura ;
Tirano que nos mata e nos dá vida .
      
           Maria Isabel da Camara Quental

quinta-feira, janeiro 01, 2015

JANEIRO

A chuva enlouquece a terra,
E o vento, de mau, sussurra,
A neve branqueia a serra,
E além o próprio mar urra.
     
Bem está a cozinheira
Ao fazer o ensopado,
Mais o velhinho, à lareira,
Recordando o seu passado.
      
            Fernando  Pinheiro